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[Convite à Reflexão] - Capelania UCPel
29.10.2014 | 14:27 | #capelania-e-identidade-crista
[Convite à Reflexão] - Capelania UCPel
Esta apresentação dos textos da semana corrente bem poderia se intitular “Para não reclamarmos da vida...”. Vivemos num mundo no qual se exacerbou o indivíduo. Nossa cultura tem provocado um grande inchaço do “eu”, que passou a ocupar o centro da dinâmica social. Por outro lado, no encerramento de outubro, mês missionário, podemos ter presente a atitude de decentramento, de saída de si para ir ao encontro da pessoa do outro, que é como o papa Francisco concebe fundamentalmente a missão (cf. Evangelii Gaudium, nº 20: “sair da própria comodidade e ter a coragem de alcançar todas as periferias que precisam da luz do Evangelho”).

Nesta semana, então, vamos abordar duas situações que nos colocam ante a interpelação que brota de outras pessoas, em quem somos chamados/as a reconhecer nossa irmã, nosso irmão.

Primeiro, a epidemia do vírus ebola, que está condenando populações inteiras a condições subumanas. Recursos há. Porém, esses estão concentrados em poucas mãos, sustentando a ostentação e o luxo de uma minoria, quando não direcionados para a fabricação e comércio das armas de morte que geram lucros astronômicos. Desse modo, pouco sobra para a saúde das pessoas e povos pobres. Enquanto a enfermidade não atinge a “América”, enquanto não aportar na ilha de Manhatan ou nas capitais da Europa, o problema ainda não começou a existir para o “Ocidente”.

O segundo tema é o do trabalho infantil em nosso país. Motivado pelo dia da criança (12/10), Leonardo Sakamoto traz presente a realidade, tantas vezes camuflada, da exploração de nossas crianças e adolescentes, até o absurdo de serem convertidas em vítimas da escravidão moderna. Ainda estamos longe de poder celebrar o dia de todas as crianças, incluindo essas que suportam o pesado fardo de sofrer sob o trabalho escravo.

O Papa Francisco, em sua homilia durante a Missa por ocasião do centenário do início da primeira grande guerra (13/09/2014), evocando o episódio bíblico de Caim e Abel (Gn 4, 1-16), denuncia o descaso com que tantas vezes são tratadas as pessoas nossas irmãs: “A mim, que me importa?” Ante a dor do outro, a pergunta, pois, que de fato vale, e que se constitui em verdadeiro divisor de águas, será sempre: “o que vale a vida dos pobres, de uma pessoa pobre, de um país pobre?” Na tradição cristã, o apelo não poderia ser mais claro e inequívoco: “Tive fome e me destes de comer; tive sede e me destes de beber; estive doente, preso, nu, migrante, e viestes a mim [...] Toda a vez que fizestes isso ao menor de meus irmãos foi a mim que o fizestes” (cf. Mt 25, 31-46).


Um hospital do inferno, em uma cidade tomada pelo ebola
Adam Nossiter, em Makeni (Serra Leoa), 02/10/2014 (tradutor: George El Khouri Andolfato)

"Onde está o cadáver?" gritou o trabalhador da equipe de enterro, abrindo a porta da ala de isolamento do hospital público daqui com um chute. O corpo estava bem diante dele, um homem jovem de corpo robusto que ficou estirado no chão a noite toda, com sua mão direita retorcida em um desajeitado punho cerrado.

Os outros pacientes, normalmente trancados lá dentro, estavam doentes demais para levantar seus olhos enquanto o corpo era carregado. Enfermeiros, alguns não usando luvas e outros em roupas comuns, amontoavam-se ao lado da porta, enquanto poças de fluidos corporais dos pacientes se espalhavam até sua beira. Um trabalhador chutou outro homem no chão para ver se ainda estava vivo. O pé do homem se moveu e a equipe seguiu em frente. Eram 13h30.

Na ala seguinte, uma menina de 4 anos estava caída no chão envolta em urina, com a boca sangrando e com os olhos abertos. Um cadáver estava no canto - uma mulher jovem, com as pernas abertas, que morreu na madrugada. Uma criança pequena estava em um colchonete assistindo enquanto a equipe removia o corpo, contornando um menino pequeno que permanecia imóvel ao lado de baldes pretos de vômito. Eles borrifaram cloro no corpo, e na menininha no chão, enquanto partiam.

À medida que a epidemia de ebola se intensifica em partes do oeste da África, países e agências de ajuda estão prometendo responder com maior força. Mas a doença está correndo mais rápido que as promessas, varrendo áreas que vinham sendo em grande parte poupadas da investida e que não estavam nem um pouco preparadas para ela.
As consequências em lugares como Makeni, uma das maiores cidades de Serra Leoa, são devastadoras.

"O país inteiro foi atingido por algo para o qual não estava pronto", disse a médica Amara Jambai, diretora de controle e prevenção do Ministério da Saúde de Serra Leoa.
Bombali, o distrito que inclui a cidade, passou de um caso confirmado em 15 de agosto para mais de 190 neste fim de semana, com mais dezenas de casos suspeitos. Em um sinal de quão rapidamente a doença se espalhou, pelo menos seis dezenas de novos casos foram confirmados no distrito apenas nos últimos dias, disseram autoridades de saúde.
O governo colocou o distrito, a cerca de 190 quilômetros a nordeste da capital, Freetown, sob quarentena no final da semana passada, tornando oficial o que já estava estabelecido em solo. Os doentes de ebola estão morrendo sob árvores em centros de isolamento ou em alas fétidas de hospitais, cercados por poças de dejetos infecciosos, sendo cuidados da melhor forma possível por enfermeiros pouco treinados e minimamente protegidos, alguns vestindo apenas jeans.

"Não há treinamento para o pessoal aqui", disse o médico Mohammed Bah, diretor do hospital público daqui. "O treinamento se resume a um power point. É muito difícil administrar o ebola aqui."

Nas últimas semanas, o mundo prometeu intensificar sua resposta à epidemia, que já se espalha há mais de seis meses. Os Estados Unidos enviaram uma equipe militar para a vizinha Libéria, com planos para construção de 18 centros de tratamento para escorar o sistema de saúde em colapso. Os britânicos prometeram construir hospitais de campo em quatro áreas urbanas em Serra Leoa, incluindo esta. Os franceses estão montando um centro de tratamento e um laboratório na Guiné. Os chineses enviaram um grande número de pessoal médico para a região e converteram um hospital que construíram fora de Freetown em um centro de isolamento para os doentes de ebola. Os cubanos prometeram enviar mais de 400 médicos para ajudar a combater a doença na região.

Mas pouca dessa ajuda chegou a esta cidade. Os mortos, os gravemente enfermos, aqueles que estão vomitando ou com diarreia, são colocados entre pacientes que ainda não foram confirmados como vítimas de ebola - não há nem mesmo um laboratório aqui para realização de exames. Em um dos três centros de isolamento em Makeni, pacientes de ebola aturdidos permanecem em contato uns com os outros, próximos dos funcionários de saúde e dos soldados que os vigiam. O risco de contágio é elevado e as precauções são mínimas.

"Nós os encorajamos a não terem contato com fluidos corporais", disse a autoridade médica do distrito, o médico Tom Sesay.

Não há centro de tratamento do ebola aqui e os pacientes, alguns deles gravemente doentes, precisam enfrentar oito horas de viagem por estradas de terra ruins até o centro dirigido pela Médicos Sem Fronteiras em Kailahun - isto é, quando há espaço disponível lá. Alguns morrem no caminho. Pelo menos 90 pessoas já morreram no distrito, disseram autoridades de saúde - um número que ultrapassa em muito o relatado pelo governo para Bombali. Mas a Organização Mundial da Saúde e outros ainda utilizam as estatísticas do governo de Serra Leoa, que parecem subestimar seriamente o número de vítimas.

Fora do quartel-general do diretor médico do distrito à beira de Makeni - um centro de mineração, em dias melhores - ambulâncias correm constantemente em busca de novos corpos. Relatos de novos casos surgiram ao longo de todo o fim de semana.

"Nós estamos lutando para descobrir como controlar a epidemia", disse Sesay. "Mas não ajuda o fato de não termos para onde levar nossos pacientes."


Se for eleito, vou botar esses vagabundos de 12 anos para trabalhar
Leonardo Sakamoto (12/10/2014)

O trabalho pode fazer parte da formação pessoal, desde que não afete o crescimento do indivíduo. É legalmente autorizado a partir de 14 anos como aprendiz ou de 16 em qualquer outra atividade que não seja perigosa ou insalubre.

Muitas empresas, contudo, já utilizam jovens de 15 anos para fazer atividades de gente de 18. Usam como justificativa que treinam para o futuro, mas, na verdade, usam mão de obra barata. Como todos sabemos, o futuro dos ricos é administrar, medicar, planejar. O dos pobres, fritar, estocar, limpar. Imagine, então, se houvesse a anuência constitucional para baixar a idade…

Com menos tempo para se dedicarem a seu crescimento e ao desenvolvimento de consciência sobre o mundo e si mesmas, as crianças tornam-se adultas que sabem o seu exato lugar na sociedade e trabalharão duro para o crescimento do país, mas sem refletirem sobre seus direitos e sem criticarem seus chefes e governantes por péssimas condições de vida.

O tema do trabalho infantil praticamente passou ao largo das eleições. Mas tenho certeza que se algum candidato ou candidata, em um rompante de sinceridade, defendesse os projetos de lei que correm no Congresso Nacional sugerindo a redução da idade mínima de 14 para 12 ou 10 anos, ganharia a simpatia popular.

Parte dos trabalhadores que adentraram a linha do consumo adota com facilidade o discurso de que “só o trabalho liberta''.

Conquistaram algo com muito suor e têm medo de perder o pouco que têm, o que é justo e compreensível. Mas isso tem consequências.

Em pesquisas de opinião sobre políticas de habitação, por exemplo, quem tem pouco abraça por vezes um discurso violento, que seria esperado dos grandes especuladores urbanos e não de trabalhadores. Afirmam que, se eles trabalharam duro e chegaram onde chegaram sozinhos, é injusto que sem-teto, sem-terra ou indígenas consigam algo de “mão-beijada'' por parte do Estado.

Ignoram que o que é defendido por esses excluídos é apenas a efetivação de seus direitos fundamentais: ou a terra que historicamente lhes pertenceu ou a garantia de que a qualidade de vida seja mais importante do que a especulação imobiliária rural ou urbana.

E que dignidade não é algo que tem que ser conquistado a duras penas através do esforço individual, mas faz parte do pacote de direitos sociais, econômicos, culturais e ambientais que você deveria ter acesso simplesmente por ter nascido. Ignoram porque aprenderam que as coisas são assim.

Isso é muito comum quando tratamos de trabalho infantil. Surgem leitores bradando: “eu trabalhei desde cedo e isso moldou meu caráter''; “aprendi a dar valor às coisas com meu suor desde pequeno''; “criança, ou está vagabundeando ou está trabalhando''.

Exemplos são usados para mostrar que, trabalhar desde pequeno, é o caminho.




 
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