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[Convite à Reflexão] - Capelania UCPel
16.04.2014 | 12:11 | #capelania-e-identidade-crista
[Convite à Reflexão] - Capelania UCPel
Nesta semana apresentamos duas reflexões do papa Francisco. Em um ano de pontificado, ele tem sido reconhecido (e não apenas dentro das fronteiras da Igreja Católica, mas por diversos segmentos da sociedade) por sua postura humana e espiritual aberta, de diálogo, despojamento e serviço. Ambos os textos estão intimamente relacionados com a presença da Igreja no mundo de hoje, como já nos convocava o Concílio Vaticano II, especialmente nos documentos Gaudium et Spes e Lumen Gentium. As palavras de Francisco, pronunciadas durante a 2ª Conferência Internacional sobre Combate ao Tráfico Humano, abordam esse que é também o tema da Campanha da Fraternidade deste ano, no Brasil. Tal fenômeno social se deve, em grande parte, à vulnerabilidade a que estão relegadas as populações empobrecidas de nosso país e do planeta. Francisco assume, em nome da Igreja mas também com envolvimento pessoal direto, o compromisso de colaborar na erradicação dessa chaga da humanidade. 

O segundo texto é a homilia de Francisco, em julho de 2013, em Lampedusa, centro de concentração de migrantes que, atravessando todos os perigos do mar, buscam alcançar algum porto (ou porta) que os acolha e permita participar, de alguma maneira, dos benefícios prometidos pela abundância das nações ricas. Francisco denuncia a “globalização da indiferença” e nos interpela (como pessoas humanas e, de modo especial, como quem compartilha da fé cristã): “onde está o teu irmão?”, “onde está tua irmã?”.

Entramos na Semana Santa. Que a possamos viver bem! E que ela nos sirva de coroamento ao tempo litúrgico da Quaresma.

Um boa leitura, em espírito de conversão e vida nova!


Papa afirma que tráfico humano é uma chaga na humanidade

No último dia 10/04, o papa Francisco pronunciou discurso durante a 2ª Conferência Internacional sobre Combate ao Tráfico Humano. O evento, que teve início no dia 09/04, no Vaticano, é uma iniciativa da Conferência Episcopal da Inglaterra e Gales, que tem a finalidade de construir uma rede de combate a este tipo de crime. Participaram do encontro cerca de 120 pessoas, entre autoridades policiais que atuam na luta contra o tráfico humano, representantes da Igreja Católica e trabalhadores humanitários.

Em seu discurso, o papa Francisco afirmou que o tráfico de seres humanos é uma “chaga no corpo da humanidade contemporânea, uma ferida na carne de Cristo”.
“O fato de estar aqui, para unir nossas forças, significa que queremos que as estratégias e as competências estejam juntas e se reforcem pela compaixão evangélica, pela proximidade de homens e mulheres vítimas deste crime”, disse o papa.

Francisco agradeceu a presença das autoridades policiais que se dedicam a lutar contra este “triste fenômeno”, e dos trabalhadores humanitários, cuja tarefa principal é “fornecer hospitalidade, cordialidade e possibilidade de resgate às vítimas”. De acordo com o papa, são duas abordagens diferentes, mas que “podem e devem andar de mãos dadas”. Para Francisco, é por esta razão que eventos como este são de grande utilidade, pois permitem o diálogo e o confronto a partir de enfoques complementares.

O papa exortou ainda a comunidade internacional “para que adote uma estratégia ainda mais unânime e eficaz de combate ao tráfico humano, de modo que, em todas as partes do mundo, homens e mulheres jamais possam ser utilizados como meio para um fim, e para que sua dignidade inviolável seja sempre respeitada”.

Disse que, com os altos funcionários encarregados da ordem pública dentro da comunidade internacional, “a Igreja se compromete a erradicar o flagelo desta grave atividade que abusa das pessoas vulneráveis”. Explicou que a conferência é parte de um processo no qual há um trabalho conjunto em âmbito internacional para desenvolver estratégias de prevenção, atenção pastoral e reintegração das vítimas.

“Estou pessoalmente empenhado em parceria com a Igreja e a sociedade civil para levar à Justiça os responsáveis por estes crimes hediondos e aliviar o sofrimento das vítimas”, concluiu.

Fonte: CNBB


HOMILIA DO PAPA FRANCISCO
NA MISSA PELAS VÍTIMAS DOS NAUFRÁGIOS
Campo Desportivo "Arena" na Localidade Salina (Lampedusa, Itália), 08 de Julho de 2013

Emigrantes mortos no mar; barcos que em vez de ser uma rota de esperança, foram uma rota de morte. Assim recitava o título dos jornais. Desde há algumas semanas, quando tive conhecimento desta notícia (que infelizmente se vai repetindo tantas vezes), o caso volta-me continuamente ao pensamento como um espinho no coração que faz doer. E então senti o dever de vir aqui hoje para rezar, para cumprir um gesto de solidariedade, mas também para despertar as nossas consciências a fim de que não se repita o que aconteceu. Que não se repita, por favor. Antes, porém, quero dizer uma palavra de sincera gratidão e encorajamento a vós, habitantes de Lampedusa e Linosa, às associações, aos voluntários e às forças de segurança, que tendes demonstrado – e continuais a demonstrar – atenção por pessoas em viagem rumo a qualquer coisa de melhor. Sois uma realidade pequena, mas ofereceis um exemplo de solidariedade! Obrigado! Obrigado também ao Arcebispo Dom Francesco Montenegro pela sua ajuda, o seu trabalho e a sua solidariedade pastoral. Saúdo cordialmente a Presidente da Câmara Senhora Giusi Nicolini, muito obrigado por aquilo que fez e faz. Desejo saudar os queridos emigrantes muçulmanos que hoje, à noite, começam o jejum do Ramadã, desejando-lhes abundantes frutos espirituais. A Igreja está ao vosso lado na busca de uma vida mais digna para vós e vossas famílias. A vós digo: oshià!

Nesta manhã quero, à luz da Palavra de Deus que escutamos, propor algumas palavras que sejam sobretudo uma provocação à consciência de todos, que a todos incitem a refletir e mudar concretamente certas atitudes.

«Adão, onde estás?»: é a primeira pergunta que Deus faz ao homem depois do pecado. «Onde estás, Adão?». E Adão é um homem desorientado, que perdeu o seu lugar na criação, porque presume que vai tornar-se poderoso, poder dominar tudo, ser Deus. E quebra-se a harmonia, o homem erra; e o mesmo se passa na relação com o outro, que já não é o irmão a amar, mas simplesmente o outro que perturba a minha vida, o meu bem-estar. E Deus coloca a segunda pergunta: «Caim, onde está o teu irmão?» O sonho de ser poderoso, ser grande como Deus ou, melhor, ser Deus, leva a uma cadeia de erros que é cadeia de morte: leva a derramar o sangue do irmão!

Estas duas perguntas de Deus ressoam, também hoje, com toda a sua força! Muitos de nós – e neste número me incluo também eu – estamos desorientados, já não estamos atentos ao mundo em que vivemos, não cuidamos nem guardamos aquilo que Deus criou para todos, e já não somos capazes sequer de nos guardar uns com os outros. E, quando esta desorientação atinge as dimensões do mundo, chega-se a tragédias como aquela a que assistimos.

«Onde está o teu irmão? A voz do seu sangue clama até Mim», diz o Senhor Deus. Esta não é uma pergunta posta a outrem; é uma pergunta posta a mim, a ti, a cada um de nós. Estes nossos irmãos e irmãs procuravam sair de situações difíceis, para encontrarem um pouco de serenidade e de paz; procuravam um lugar melhor para si e suas famílias, mas encontraram a morte. Quantas vezes outros que procuram o mesmo não encontram compreensão, não encontram acolhimento, não encontram solidariedade! E as suas vozes sobem até Deus! Uma vez mais vos agradeço, habitantes de Lampedusa, pela solidariedade. Recentemente falei com um destes irmãos. Antes de chegar aqui, passaram pelas mãos dos traficantes, daqueles que exploram a pobreza dos outros, daquelas pessoas para quem a pobreza dos outros é uma fonte de lucro. Quanto sofreram! E alguns não conseguiram chegar.

«Onde está o teu irmão?» Quem é o responsável por este sangue? Na literatura espanhola, há uma comédia de Félix Lope de Vega, que conta como os habitantes da cidade de Fuente Ovejuna matam o Governador, porque é um tirano, mas fazem-no de modo que não se saiba quem realizou a execução. E, quando o juiz do rei pergunta «quem matou o Governador», todos respondem: «Fuente Ovejuna, senhor». Todos e ninguém! Também hoje assoma intensamente esta pergunta: Quem é o responsável pelo sangue destes irmãos e irmãs? Ninguém! Todos nós respondemos assim: não sou eu, não tenho nada a ver com isso; serão outros, eu não certamente. Mas Deus pergunta a cada um de nós: «Onde está o sangue do teu irmão que clama até Mim?» Hoje ninguém no mundo se sente responsável por isso; perdemos o sentido da responsabilidade fraterna; caímos na atitude hipócrita do sacerdote e do levita de que falava Jesus na parábola do Bom Samaritano: ao vermos o irmão quase morto na beira da estrada, talvez pensemos «coitado» e prosseguimos o nosso caminho, não é dever nosso; e isto basta para nos tranquilizarmos, para sentirmos a consciência em ordem. A cultura do bem-estar, que nos leva a pensar em nós mesmos, torna-nos insensíveis aos gritos dos outros, faz-nos viver como se fôssemos bolas de sabão: estas são bonitas mas não são nada, são pura ilusão do fútil, do provisório. Esta cultura do bem-estar leva à indiferença a respeito dos outros; antes, leva à globalização da indiferença. Neste mundo da globalização, caímos na globalização da indiferença. Habituamo-nos ao sofrimento do outro, não nos diz respeito, não nos interessa, não é responsabilidade nossa!

Reaparece a figura do «Inominado» de Alexandre Manzoni. A globalização da indiferença torna-nos a todos «inominados», responsáveis sem nome nem rosto.

«Adão, onde estás?» e «onde está o teu irmão?» são as duas perguntas que Deus coloca no início da história da humanidade e dirige também a todos os homens do nosso tempo, incluindo nós próprios. Mas eu queria que nos puséssemos uma terceira pergunta: «Quem de nós chorou por este fato e por fatos como este?» Quem chorou pela morte destes irmãos e irmãs? Quem chorou por estas pessoas que vinham no barco? Pelas mães jovens que traziam os seus filhos? Por estes homens cujo desejo era conseguir qualquer coisa para sustentar as próprias famílias? Somos uma sociedade que esqueceu a experiência de chorar, de «padecer com»: a globalização da indiferença tirou-nos a capacidade de chorar! No Evangelho, ouvimos o brado, o choro, o grande lamento: «Raquel chora os seus filhos (...), porque já não existem». Herodes semeou morte para defender o seu bem-estar, a sua própria bola de sabão. E isto continua a repetir-se... Peçamos ao Senhor que apague também o que resta de Herodes no nosso coração; peçamos ao Senhor a graça de chorar pela nossa indiferença, de chorar pela crueldade que há no mundo, em nós, incluindo aqueles que, no anonimato, tomam decisões socioeconômicas que abrem a estrada aos dramas como este. «Quem chorou?» Quem chorou hoje no mundo?

Senhor, nesta Liturgia, que é uma liturgia de penitência, pedimos perdão pela indiferença por tantos irmãos e irmãs; pedimo-Vos perdão, Pai, por quem se acomodou,  e se fechou no seu próprio bem-estar que leva à anestesia do coração; pedimo-Vos perdão por aqueles que, com as suas decisões a nível mundial, criaram situações que conduzem a estes dramas. Perdão, Senhor!

Senhor, fazei que hoje ouçamos também as tuas perguntas: «Adão, onde estás?» «Onde está o sangue do teu irmão?».

Fonte: Vaticano
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